TEOLOGIAS DA REDENÇÃO (CONTINUAÇÃO)
Tornado assim um pecado encarnado, atraiu sobre si a cólera que
castiga o pecado, desceu até o inferno do abandono, passou até mesmo a ser visto
como rejeitado por Deus. É assim que essa teoria entende a descida de Jesus aos
infernos, contrariamente à tradição primitiva, recebida no símbolo dos
apóstolos, segundo a qual essa descida significa Jesus participando com os
defuntos seu triunfo sobre a morte. Essa visão trágica, na qual Deus se opõe a Si
mesmo em seu Filho – Deus contra Deus – inflamou a eloquência dos pregadores,
tanto católicos como protestantes.
Erro dos mais graves, também, apontado, é o fato de que tal teoria não
leva em consideração o aspecto trinitário da redenção. Porquanto Deus é
apresentado identificando-Se com uma justiça que reivindica Seus direitos, e
não mais com o Pai que gera, visto que Sua justiça exige a imolação do Filho.
Em vez de ser o Pai que ama o Primogênito, e a cuja paternidade Ele se submete,
existe apenas o Deus justiceiro. Em lugar do Filho que se entrega, há apenas o
homem-Deus que oferece um preço infinito, tratando o Pai de igual para igual:
“um paga o outro retribui” – modelo de pensamento característico, também, da
teologia jurídica.
Igualmente, criticável seria o entender que Cristo é quem reconcilia
Deus com os homens, ao contrário do que se lê: Pois era Deus que em Cristo
reconciliava o mundo consigo. (2 Coríntios 5,19). Acrescente-se, ainda, que a
redenção é um dom gratuito, uma obra que Deus realiza e que a realiza em
Cristo, que Se torna mistério da salvação – visto que, Ele foi declarado Filho
de Deus com poder, pela sua ressurreição dentre os mortos. (Romanos 1.4). E se
tornou redenção. (1 Coríntios 1.30b). Nesse caso, segundo a referida teoria,
sujeita a críticas, Cristo assumiria a iniciativa que caberia a Deus-Pai.
Estranhável, igualmente, é o fato de na teologia da substituição o Pai
que disse: Tu és meu Filho amado, em ti me comprazo (Marcos 11.1b), mostrar-Se
contra o Filho, justamente no momento em que Jesus cumpre filialmente a missão
recebida do Pai. Contexto no qual Jesus aparece como o culpado universal e não
como o Filho em Sua santidade; Ele, sem culpa ou pecado algum, o Filho amado
(Jo, 3.35), o que vive sempre na casa do Pai (João 8. 35).
Em favor dos teólogos modernos que retomaram a teoria da substituição,
o pesquisador ressalva que o fizeram situando-a realmente na Trindade. Porém,
não mantendo a imagem tradicional da Trindade, porque falam de uma ruptura
que, acreditam, ter havido entre o Pai e o Filho, ainda que procurem resolver a
questão dessa divisão direcionando-a para a comunhão trinitária.
Além disso, a teoria da substituição nega a presença do Espírito na
morte de Jesus. Vejamos as razões apresentadas para chegar-se a tal conclusão:
O Espírito Santo é comunhão e, nessa teoria, (da substituição) a morte
de Cristo caracteriza-se como uma morte-ruptura. Nega assim, a presença do
Espírito na morte de Jesus, porque o Espírito Santo é comunhão. Por isso ela
ignora a filiação de Jesus em sua morte, Jesus era Filho de Deus no Espírito
Santo. Ignorada no conceito de morte-ruptura, esta seria como a morte de um
pecador, e qual seria seu valor salvífico?
Mais uma questão surge na esteira dessa conclusão e torna impossível
fazer calar uma instigante pergunta, colocada pelo teólogo: Como poderiam,
então, os fiéis entrarem em comunhão com Deus pela participação na morte de
Jesus, se esta é uma ruptura? (Continua).