MARIA
MADALENA, APÓSTOLA DOS APÓSTOLOS
Impressiona a
tendência humana de se decidir pelo mal. A fama de Maria Madalena, como
pecadora – prostituta - é uma mostra exemplar da propensão. Não há, no Novo
Testamento, uma palavra sequer que a classifique como tal; o que se sabe é que
Jesus expulsou dela sete demônios. Na narrativa de Lucas (8.2), ela aparece
incluída entre algumas mulheres que haviam sido curadas de espíritos malignos
e de enfermidades.
Lillia Sebastiani, estudiosa
dos textos evangélicos, acredita que se tratava de misteriosos sofrimentos
psicossomaticos. E, em seguida, propõe: Seja qual for a forma de encarar o
problema, se deve sempre identificar uma anomalia. Ao que, acrescentamos e
sublinhamos não se tratar, necessariamente, de pecados tais como faltas de
natureza sexual como a prostituição. A autora conclui: O seu encontro com Jesus
marca a realização da harmonia interior e da plenitude pessoal.
A fama de “Madalena
arrependida”, invenção humana, atravessou os séculos. Até hoje o seu nome traz
à lembrança - dos menos avisados - a figura da mulher pecadora, sobrepondo-se à
da mulher liberta e santificada por Cristo. A mulher que teve a suprema graça
de ser a primeira a avistar o Ressuscitado, ficou em segundo plano; sua memória
permanece à sombra da pecadora, massacrada, ignorada e suplantada pelo
famigerado conceito que lhe fora imputado.
A mulher, digna de
ouvir a voz do Salvador, naquele domingo de Páscoa, dizendo-lhe: Eu vos saúdo!
(Mateus 28.9), e de ser encarregada por Ele de levar a mensagem da
ressurreição, foi ofuscada na história cristã por uma calúnia. Ignorada por sua
santidade, costuma ser lembrada por uma ignomínia que se apegou ao seu nome.
Como se o inconsciente coletivo se tivesse embotado diante do acontecido no
domingo da ressurreição. As pessoas, tudo indica, tiveram dificuldade para assimilar
o milagre representado pela metamorfose experimentada por Madalena: de vítima
de opressão satânica, redimida por Cristo e elevada ao papel de deuteragonista
da ressurreição (João 20. 1-18), ou seja, aquela que ocupou o segundo lugar na
cena da ressurreição.
Não posso deixar de
abrir um parenteses, aqui, a fim de admirar a tremenda lição que se pode
extrair dessa demonstração do poder transformador de Deus; do milagre dos
milagres, que é a operação do poder divino para transformar vidas, anunciado
por Cristo: O Senhor [...] enviou-me a curar os quebrantados do coração.
A apregoar liberdade
aos cativos, e dar vista aos cegos; a pôr em liberdade os oprimidos; a
anunciar o ano aceitável do Senhor. (Lucas 4.18.19).
Em Maria Madalena
cumpriu-se exemplarmente essa palavra. Ela viu-se, sob a maravilhosa graça de
Cristo, liberta de seu cativeiro e de seus opressores espirituais, para viver
a experiência que, no domingo de Páscoa, a levou a exclamar: Vi o Senhor! e
cumprir o seu mandado a fim de avisar aos apóstolos que o Senhor está redivivo
e que poderiam encontrá-lO na Galiléia.
"Apóstola dos
apóstolos”, assim ela é chamada por Bernardo de Claraval, erudito cristão, em
seu Sermones in Cantica.Título extensivo, também, às outras mulheres, que a
acompanharam na missão de proclamar o querigma da Páscoa, denominadas então de
apóstolas dos apóstolos. (Continua).