O SACERDÓCIO DE TODOS OS CRENTES
O tema a respeito do sacerdócio de todos os crentes, enfatizado na Reforma, por Lutero, como um dos princípios do protestantismo, destaca que todas as pessoas ao aceitarem Cristo como seu Senhor e Salvador, pela fé, têm acesso à graça divina - sem necessidade de qualquer mediador específico, ou seja, de um sacerdote ordenado. Ao contrário do que propalava a teologia medieval, ao afirmar terem os crentes acesso à graça divina unicamente por meio dos sacramentos da Igreja, caso em que a figura do sacerdote seria essencial. Necessariamente, serviria como instrumento do Pai Eterno na dispensação da graça e do perdão, ao apresentar as ofertas do povo de Deus.
Em contraposição, no novo tempo, conforme revelado pelo
apóstolo Pedro, todos os crentes podem oferecer sacrifícios espirituais,
agradáveis a Deus por meio de Jesus Cristo: Vós também, como pedras vivas, sois
edificados casa espiritual e sacerdócio santo, para oferecer sacrifícios
espirituais agradáveis a Deus por Jesus Cristo. (1 Pedro 2.5)
Lutero faz valer a verdade bíblica de que cada crente tem
acesso direto ao Pai, ao Lugar Santo, onde Deus habita; e não somente o sumo
sacerdote, como acontecia no passado remoto. Dispensada está, portanto, a intermediação
de pessoas especialmente ordenadas para a função porque, segundo o Novo
Testamento: Ele nos fez reis e sacerdotes para Deus e seu Pai: a ele glória e
poder para todo o sempre. Amém. (Apocalipse 1.6).
O sacerdócio levítico, do passado, instituído por Deus entre
o povo de Israel, focava-se no cargo ordenado; hoje, o sacerdócio universal
dos crentes, revelado no Novo Testamento, tem seu foco na Igreja como um todo –
constituída por crentes-sacerdotes - e pode-se destacar sem medo de errar, por
sacerdotisas.
Não obstante, eruditos cristãos, apontam um paradoxo no
pensamento de Lutero ao tratar dos efeitos desse tema sobre o universo
feminino. Ele não aceitava que as mulheres pudessem ocupar o cargo ordenado de
Pastora. Ao transferir a questão do nível teológico para o da vida prática, em
atendimento às conveniências sociais, ele declarava que as mulheres “eram
destinadas por Deus a cuidar do lar”. Incoerência na qual Lutero incorreu por
não ter conseguido esquivar-se à influência do pensamento medieval de caráter
misógino que predominava naquela sociedade. Época na qual não se vislumbrava
outra perspectiva para a mulher a não ser a de realizar-se como esposa e mãe.
Contudo, não há motivo para escândalo na atitude de Lutero, que falou como um
típico cidadão da Idade Média. Como teólogo, Lutero supera essa fraqueza, uma
vez que é, justamente, dentro da doutrina luterana que sobressai o princípio
do sacerdócio universal dos crentes. Como o próprio nome indica é universal,
sendo que a mulher compartilha do mesmo em igualdade de condições com o homem,
inclusive no acesso ao púlpito.
Saliente-se, mais uma vez, que a discriminação da mulher por
parte de Lutero não era de caráter ontológico, mas, relativa à função que
desempenhava na sociedade. A Idade Média, convém lembrar, foi uma época
fortemente dominada pelo sexismo, quando então a mulher era discriminada
simplesmente pelo fato de ser mulher. Poderia ser arriscado permitir-lhe o
acesso ao cargo pastoral, até mesmo pela celeuma que esse fato poderia causar.
Ao voltar nossa atenção para o presente século e
verificarmos, ainda, a existência de focos de discriminação contra a mulher,
no meio cristão, isto sim, é motivo de perplexidade e escândalo. Pertencer ao
terceiro milênio pensando e se comportando como um cidadão medieval no que
concerne ao reconhecimento dos direitos das mulheres cristãs, como fazem os
complementaristas (antifeministas) é, sim, incompreensível. Ao agir desse modo,
eles contrariam o exemplo e a vontade de Cristo e caminham na contramão da sociedade,
na qual os ideais da igualdade -que têm
origem cristã já estão sendo praticados no que se refere às mulheres.
O teólogo Stanley Grenz resume bem a questão ao declarar:
Os igualitários, por sua vez acreditam que, em vez de ser o
resultado de ideias seculares doentias invadindo a Igreja, o impulso para a
ordenação de mulheres representa uma obra do Espírito. E a capacitação de
mulheres para o ministério poderia possivelmente revitalizar a Igreja
contemporânea.
Todo cristão sabe que vivemos na era da graça. Tendo em vista
esse fato, podemos acrescentar que a saudação de Jesus, ressurreto - ao dizer
às mulheres: Eu vos saúdo! – não possuía o significado apenas de um cumprimento
comum; à semelhança daquele que dirigimos uns aos outros diariamente. O
Salvador, ao inaugurar essa nova era, estava abrindo as portas de um novo tempo
para o gênero feminino. Sua saudação, efetivamente, teria o significado de:
sejam bem-vindas ao Reino de Deus! Aleluia!
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